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O cuidar terapêutico em tempos de medicalização

  • Foto do escritor: Espaço Teares
    Espaço Teares
  • 16 de abr. de 2018
  • 2 min de leitura


As noções de saúde/doença são atravessadas por valores, preconceitos, interesses e conflitos. Na atualidade há um intenso investimento na regulação dos modos de viver em nome da “saúde”: o sujeito deve estar vigilante em relação aos seus hábitos, escolhas, alimentação, consumo, etc. O avesso do saudável e do desejável é visto como desviante, aquele que não possui controle sobre sua própria vontade, não é capaz de responsabilizar-se por si mesmo, objeto de recriminações e culpabilizações. O autocontrole é a chave para a moderação, a vigilância e o ajustamento a uma vida saudável que pode ser traduzida por atributos como ser magro, ser feliz, ser bem-sucedido, ser “bem resolvido”, em muitos casos ser resiliente...


Além do incentivo ao autocontrole, vivemos num cenário que favorece atitudes de vigilância nas escolas, nos espaços de trabalho, na família, na mídia, nas redes sociais, olhares e discursos que multiplicam diagnósticos, tratamentos e estratégias preventivas. Em meados de 2012 o Conselho Federal de Psicologia lançou uma campanha nacional: “Não à medicalização da Vida”, compreendendo a medicalização como: “processo que transforma questões de ordem social, política, cultural em ‘distúrbios’, ‘transtornos’, atribuindo ao indivíduo uma série de dificuldades que o inserem no campo das patologias, dos rótulos, das classificações psiquiátricas” (https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/Caderno_AF.pdf).


A versão atual do DSM (Manual de Estatísticas de Diagnósticos) da Associação de Psiquiatria Americana, publicada em 2013, ilustra esta tendência com o aumento de categorias diagnósticas que chegam a 450 e avançam na patologização do sofrimento. Esta tendência à psiquiatrização da vida transforma sofrimentos e dores ligados às incertezas e conflitos em categorias diagnósticas geralmente acompanhadas de prescrições medicamentosas. O consumo de medicamentos psicotrópicos no Brasil como os benzodiazepínicos, indicados para o tratamento da ansiedade, cresceu vertiginosamente, inclusive entre jovens. Parece que cada vez mais se reduz o espaço para as manifestações de sofrimento, de cansaço, de vazio, de crise, bem como o tempo para a elaboração das flutuações do viver.

Auto-controle, padronização de modos de vida, culpabilização do sujeito, sensações de impotência e de fracasso diante de uma cultura que exige performance e resultados. Marcas contemporâneas que atravessam a produção do adoecimento e dos modos de cuidar.


Problematizar o cuidar é essencial, pois às vezes a expressão cuidar abriga práticas prescritivas e tutelares na contramão da produção da autonomia! Perguntar pelo sentido do cuidar é fundamental!

O cuidar é algo tecido no encontro terapêutico, pelo que se diz e se escuta, pelo que muitas vezes silencia e, no entanto, pode ser capturado por variadas sensibilidades, sempre apoiado nas necessidades do sujeito, no universo de possibilidades que podem ser criadas e compartilhadas. Neste território, não há lugar para receitas pré-fabricadas de saúde, atitudes críticas e julgamentos. Mas produção de solidariedade, cuidado, interesse.

A potência viva e transformadora do cuidar terapêutico se conjuga com respeito, liberdade, aprendizagem, compartilhamento e autonomia.


Sundfeld, A. C.

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